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quinta-feira, 5 de novembro de 2009

As circunstancias fazem os indivíduos tanto quanto estes fazem as circunstancias

Maria Angélica, graduanda em Filosofia ISTA-BH-MG


Seria impossível compreender os ideais revolucionários presentes nas décadas de 60 e 70 sem levar em conta toda a produção teórica dos universitários deste período. Estes, indignados com circunstâncias políticas e sociais – miséria, desigualdades, violência, humilhações – irromperam num sentimento generalizado de inconformismo e se engajaram em movimentos de resistência.

É preciso, no entanto, reconhecer a influência teórica que alimentava este sentimento de indignação como também o desejo de emancipação. Inúmeras pichações nos muros de Paris, Berlim e mundo afora faziam referência aos 3 “M” de 68 – Marx, Mao e Marcuse. Apenas um nome mereceu maior destaque neste período: Che Guevara ( 1928 / 1967 ). Mas qual foi sua influência? O que ele tinha a dizer naqueles anos de ditadura? Vamos pois à suas próprias palavras: “a maior ambição revolucionária é ver toda criatura libertada de sua alienação”. Fica claro que Che estava colocando em aberto a noção de liberdade, de emancipação e da própria razão. Mas pode a razão se vincular à lógica da revolução? E por que não, se é a razão crítica um pensamento que questiona, que indaga, que não se conforma com o óbvio?

É isto que incomodava Che. Em minha visão, ele está nesta frase fazendo alusão à consciência política necessária ante a ditadura do imperialismo americano. Creio que ele está lutando contra o que Nietzsche ( 1844 / 1900 ) chama de “animalização em rebanho – indivíduos transformados pelas instituições em pequenos, covardes e gulosos”.

Mas o que tudo isso tem a ver com pressuposto primeiro deste artigo que é uma reflexão filosófica? Ora, a filosofia lida com questões essenciais de nossa existência – qual o sentido da vida, qual a base da verdade... Diferentemente do que corre no senso comum onde a filosofia está distante do conhecimento prático por tratar de temas muito abstratos, esta suscita a atitude crítica, nos leva a recusar o conformismo presente no mundo cotidiano, não permite o cerceamento das idéias em uma única perspectiva, questiona os limites. O sentido da reflexão filosófica se volta exatamente para a vida prática dos indivíduos.

Se quisermos compreender uma atitude filosófica, basta pensarmos na Alegoria da Caverna ( Livro VII de A República, de Platão ) onde “quem se encanta de fato por um conhecimento que não se ‘com-forma’, tem a oportunidade de ser um indivíduo mais claro de si mesmo, menos domesticado por fatores externos, e num ato de liberdade, pode romper com o já estabelecido”.

Mas tudo isso até agora dito, tem um propósito definido. Voltando à juventude dos anos 60/70, que rejeitou a alienação e lutou pela liberdade, penso: em que estes jovens diferem dos de hoje? O que os jovens do séc.XXI tem a ver com as idéias do revolucionário Che? Que valores teriam suas idéias hoje?

Você pode argumentar que hoje já não cabem mais guerrilhas. Che acreditou na luta armada num momento de lutas armadas. Hoje vivemos numa época de regime democrático ( democracia em benefício de quem? ) e Che agiu de acordo com o que acreditou. Porém penso que mesmo vivendo em outros tempos, o perfil de resistência não pode ser esquecido para quem acredita em transformação social. Certa cientista política disse: “ Nós precisamos estar indignados”.

Assistindo ao filme “Batismo de sangue” e vendo o engajamento político dos dominicanos, daqueles religiosos tão jovens, me pergunto se mesmo a grande vitória da ditadura ter sido a despolitização da juventude, ela também tirou a sensibilidade de tal juventude? Frei Tito diz em seus momentos de angústia no exílio: “Sinto saudades de meu país, dei minha vida pelo meu povo e não suporto a saudade que sinto dele”. Dei minha vida pelo meu povo...

E a questão que suscito agora é: onde está o compromisso ideológico dos leitores deste artigo, mais especificamente, de nossa atual juventude, diante dos esquemas de benefícios imperialistas a que somos submetidos? Tem essa juventude memória política? O que é democracia do ponto de vista capitalista? Existe compromisso político com a democracia de nosso país?

Abre espaço aqui a noção filosófica de “liberdade, igualdade, fraternidade”. Nossa juventude foi criada num país que se diz democrático mas é desigual, convive com a miséria e a violência, tem em sua alma o preconceito. E é por isso que inspirada na máxima de Che, digo que “o maior ideal filosófico é ver toda criatura libertada de sua alienação”.

Sei que este artigo pode encontrar resistência, pois “estar alienado é uma opção”. Mas até quando vai

“dormir nossa juventude tão distraída

sem perceber que é subtraída

em tenebrosas transações...?”

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